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AUTOCARAVANISMO – Passado, Presente e Futuro

A prática do lazer ao ar livre tem crescido significativamente nos últimos anos e a utilização de caravanas e autocaravanas tem sido cada vez mais uma solução encontrada para beneficiar do contacto com a natureza, conhecer novos lugares, viajar com conforto e mobilidade. 

Nos últimos meses, muito se tem falado e discutido sobre a alteração do código da estrada (Artigo 50.º-A) e o seu impacto no autocaravanismoNeste artigo, expomos o nosso ponto de vista sobre esta situação e mostrar que nem tudo está perdido.  

Artigo 50.º-A
Proibição de pernoita e aparcamento de autocaravanas (Entrada em vigor: 2021-01-08)

1 – Sem prejuízo do disposto nos artigos 49.º e 50.º, são proibidos a pernoita e o aparcamento de autocaravanas ou similares fora dos locais expressamente autorizados para o efeito.
2 – Para efeitos do disposto no número anterior, considera-se:
a) ‘Aparcamento’, o estacionamento do veículo com ocupação de espaço superior ao seu perímetro;
b) ‘Autocaravana ou similar’, o veículo que apresente um espaço habitacional ou que seja adaptado para a utilização de um espaço habitacional, classificado como ‘autocaravana’, ‘especial dormitório’ ou ‘caravana’ pelo Instituto da Mobilidade e dos Transportes, I. P.;
c) ‘Pernoita’, a permanência de autocaravana ou similar no local do estacionamento, com ocupantes, entre as 21:00 horas de um dia e as 7:00 horas do dia seguinte.
3 – Quem infringir o disposto no n.º 1 é sancionado com coima de (euro) 60 a (euro) 300, salvo se se tratar de pernoita ou aparcamento em áreas da Rede Natura 2000 e áreas protegidas, caso em que a coima é de 120€ a 600€.

A GoCaravaning, desde o surgimento da proposta de alteração do código da estrada que encetou contactos junto da ACAP e das empresas especializadas do setor. Participámos em diversas reuniões, foram produzidas análises de mercado. A par disso, foram contactados os fabricantes das marcas representadas, pois grande parte das marcas estão inseridas nos dois grandes grupos económicos do setor (Hymer e Trigano) para que fosse criado um movimento de pressão. Muitos contactos foram feitos a nível informal em várias instâncias, sempre desenvolvendo todos os esforços para que a prática do autocaravanismo prossiga da melhor forma possível.

No nosso entender, não faz de facto sentido algum tentar regular um setor tão importante de turismo com meia dúzia de linhas e de forma tão redutora. Neste sentido, estamos solidários com todas as ações que foram desencadeadas por diversas entidades para uma alteração e adaptação da lei. 

Mas consideramos ser importante contextualizar o setor e perceber como se chega até aqui. 

PASSADO – O Mercado

O autocaravanismo tem vindo a crescer de forma exponencial por toda a Europa nos últimos anos. A ECF (European Caravan Federation) estimava que no final de 2018 o parque de autocaravanas em utilização na Europa seria de 2.008.487 veículos! Metade destes veículos encontravam-se registados em França e na Alemanha, sendo a estimativa para Portugal de 10.000 veículos.

Se analisarmos as estatísticas disponibilizadas pela ACAP aos seus associados (Associação que fazemos parte), verificamos os seguintes números de matrículas de autocaravanas entre 2017 a Dezembro de 2020:

* Nas matriculações de novos, as matrículas da Volkswagen encontram-se segmentadas, pois serão praticamente todos para aluguer.

Uma análise rápida a estes valores permite perceber que a grande fatia de veículos matriculados não provém das empresas especializadas que se dedicam principalmente à comercialização de veículos novos, mas sim de veículos usados importados, que nestes 4 anos representam 83% das matrículas nacionais.

E porque é que a análise de mercado é importante para a realidade atual? É de extrema importância. Percebe-se que: 

  • Também Portugal cresceu de forma radical no número de utilizadores de autocaravanas;  
  • Que muitos destes veículos não são transacionados pelas empresas especializadas, mas sim por particulares ou por entidades sem grandes competências técnicas neste tipo de veículos e que esta fragmentação do mercado dificulta a união entre os intervenientes do setor; 
  • Que a pressão nas estradas e estacionamentos teve necessariamente de aumentar. 

PRESENTE – A prática do autocaravanismo
e as infraestruturas existentes

É inequívoco que o autocaravanismo é sinónimo de liberdade e mobilidade. A possibilidade de se partir sem destino, visitar cidades ou os pequenos recantos rurais, aproveitar a praia ou a montanha são ideais que estão presentes na mente dos autocaravanistas atuais e que fazem parte do sonho de muitos que têm a ambição de um dia partir à aventura numa autocaravana.  

Os seus utilizadores são pessoas ativas e valorizam o conforto da sua casa rolante, potenciando o convívio a nível familiar, social e a ligação com a natureza e comunidades. A grande generalidade das autocaravanas que circulam têm excelentes condições de habitabilidade, conforto e limpeza. 

Em Portugal, existem inúmeras estruturas de apoio às autocaravanas. Analisando os registos disponíveis, conclui-se que existem atualmente no território nacional mais de 240 áreas de serviço para manutenção, sendo que destas, grande parte apresentam possibilidade de pernoita. Nesta análise não estão considerados os parques de campismo nem algumas estruturas privadas como quintas que hoje estão ligadas ao projeto Portugal EasyCamp. São mais de 600 locais de estacionamento, somando estas estruturas a outros parques dedicados a autocaravanas. O autocaravanismo continua a ser possível, viável, seguro utilizando estas infraestruturas.

Naturalmente que é problemática a visão estreita da lei: existem ainda em Portugal inúmeros locais a visitar que não estão próximos de áreas de pernoitas autorizadas e consequentemente, nesta fase, obrigará os utilizadores a procurar soluções alternativas.

É neste ponto que consideramos que o normativo devia ser adaptado e pensado. A prática de um autocaravanismo correto e sustentável sempre foi uma preocupação nossa. Muitas recomendações são passadas verbalmente nas explicações que fazemos dos veículos e recentemente criámos um manual de boas práticas autocaravanistas, disponibilizado especialmente a todos que nos alugam veículos. Uma autocaravana tem todas as condições para uma pernoita segura, sem deixar rasto negativo na sua passagem. Mas sem boas práticas, o autocaravanismo torna-se insustentável e alvo de pesadas críticas.

FUTURO – Qual o caminho?

Já pensou subir aos Himalaias? Sabia que: 

  • Existem no mundo apenas 14 montanhas mais altas que 8.000 metros;
  • Everest é o pico mais alto com 8.849 metros e o K2 (o segundo pico mais alto – 8611 metros) é considerado a montanha mais difícil de escalar (mais pessoas estiveram no espaço do que no topo desta montanha)
  • Todas elas pertencem aos Himalaias na área chamada “death zone”, onde a quantidade de Oxigénio é insuficiente para suportar a vida humana;
  • No passado apenas era necessário pagar cerca de 11.000 Eur para subir o Everest e não era necessária qualquer experiência! Hoje no Nepal, é necessário provar que já escalaram uma montanha mais alta que 6.500 metros para pedir permissão para escalar o Everest, juntamente com outras certificações de saúde;
  • Muitos dos corpos falecidos nunca conseguiram ser resgatados devido à dificuldade, pois o intervalo de tempo para escalar o Everest por ano é de 10 a 15 dias em Maio antes das monções;
  • A 23 de Maio de 2019, 344 pessoas chegaram ao topo do Everest num só dia. Topo este que tem apenas uma área de 2 mesas de ping-pong;
  • Em 2019 mais de 21 pessoas morreram nos picos dos Himalaias.

Este é ubom exemplo de uma expansão radical de um turismo de aventura que requereu medidas especiais para o regular. E apresentamos esta situação, pois entendemos que no autocaravanismo é necessário perceber que o crescimento traz desafios e que para além dos autocaravanistas experientes, existem muitos novos utilizadores a entrar no mercado, alguns por compra mas muitos através do aluguer, apenas para usufruir de uma experiência. 

Por issoacreditamos que é essencial, fundamental, criar um normativo que regule a prática do autocaravanismo. A limitação do Art. 50-A não é razoável e não resolve minimamente alguns dos problemas que podem existir: 

  • Utilização abusiva do espaço de estacionamento; 
  • Estacionamento e pernoita em áreas protegidas; 
  • Despejos em sítios não previstos e autorizados; 
  • Permanências prolongadas. 

Um regulamento bem desenhado teria inúmeras vantagens:

  • Colocaria Portugal como país pioneiro na regulação deste setor;
  • Permitiria criar uma base legal de sustentação a um código de conduta para todos os autocaravanistas, fortalecendo a sua imagem e permitindo aos novos utilizadores um contexto concreto de utilização;
  • Permitiria às autoridades ser mais rigorosas e objetivas na fiscalização, punindo aqueles que pelos seus comportamentos afetam a imagem dos autocaravanistas.

Os passos dados pelos interessados pelo autocaravanismo junto do Parlamento Nacional e dos vários partidos levou à criação de um Projeto de Lei n(.º 770/XIV) por parte do Partido Comunista Português (PCP), tendo este sido apresentado no passado dia 29 de Março (saber mais). Este projeto lei é um passo muito importante, pois para além de contemplar a alteração do código da estrada, estabelece linhas de pensamento importantes e de base para o regulamento que deveria existir.

Acreditamos que estamos numa fase de transição mas que existirá por parte de todas as entidades governamentais e associativas o bom senso de encontrar a solução que defenda os autocaravanistas nacionais e estrangeiros e que Portugal continue a ser um país de turismo itinerante, pois existe muito para ver e explorar. A Gocaravaning continuará a apoiar e a lutar pela melhor solução e continuará a sensibilizar os seus clientes de compra e de aluguer para as boas práticas de utilização das autocaravanas para que todos possam contribuir para um mundo melhor.

BONS PASSEIOS!

Informação extra:

Para maior conhecimento do mercado nacional de autocaravanas novas: 

* Capron: Em 2006, a Hymer e a Dethleffs fizeram uma parceria para produzir duas novas marcas na mesma fábrica, sendo que cada marca teria acesso a metade da produção total. Desta fábrica, saem as marcas Carado e Sunlight, com diferenças estéticas mas com distribuições iguais. Todas elas são registadas com a marca Capron.